terça-feira, 15 de junho de 2010

O Esgotamento Sanitário em Salvador: Questionamentos sobre o Programa Bahia Azul

A concepção do Sistema de Esgotamento Sanitário de Salvador - SESS se deu no ano de 1968, com o Planejamento Geral do Esgotamento Sanitário de Salvador, realizado pelo escritório do Engo. Walter Sanches e Associados. O sistema previa a execução de rede coletora de esgoto em 14 bacias e estações elevatórias, de forma que os esgotos fossem conduzidos para um único ponto, o emissário submarino situado no Rio Vermelho.

Entre 1971 e 1974 foram construídas as bacias coletoras de esgoto da Barra, Rio Vermelho e Pituba e o emissário submarino, com 1.020 metros no seu trecho terrestre e 2.000 metros no trecho marítimo, lançando os esgotos a uma profundidade de 27 metros.

Em 1984, a Empresa Baiana de Águas e Saneamento S.A. (EMBASA) elaborou o Plano Diretor de Esgoto da RMS, ampliando para 42 o número de bacias contempladas no Planejamento Geral de 1968 devido à expansão da área urbana e à incorporação do município de Lauro de Freitas. A concepção do sistema foi mantida, prevendo-se, no entanto, outro emissário submarino na altura do rio Jaguaripe e uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) às margens do rio Joanes para atender à região de Lauro de Freitas. Os esgotos dos subsistemas Subúrbio, Comércio e Pituaçu seriam revertidos para o do Camarajipe, para posterior lançamento no emissário submarino existente. Em 1993, a EMBASA promoveu a Revisão e Atualização do Plano Diretor de Esgoto (RAPDES), mantendo a mesma concepção do anterior, realizando apenas a revisão da projeção da população e das vazões de esgoto.

Atualmente, o esgotamento sanitário da cidade do Salvador é realizado por um sistema misto que envolve:

- o rede coletora pública, integrada a uma Estação de Condicionamento Prévio (ECP) e ao emissário submarino do Rio Vermelho, que atende a 15 % da população, e

- o sistemas independentes que servem a diversos conjuntos habitacionais, os quais dispõem de redes e estações de tratamento. Atualmente existe cerca de uma centena de sistemas independentes, os quais atendem a 13 % da população da cidade.

Em conjunto, esses sistemas atendem a 28% da população.

Segundo a RAPDES (1993), o emissário submarino tem capacidade para transportar e dispor 7,8 m3 /s. Atualmente o emissário veicula 1,2 m3/s, atingindo apenas 15% de sua capacidade e atendendo, como já dito, a 15 % da população de Salvador. Foram 100 milhões de dólares do dinheiro público investidos nessa obra, que se encontra ociosa há duas décadas. Segundo a revisão final da RAPDES (1995), a nova previsão é que a capacidade máxima do emissário, de 8,3 m3/s, seja atingida em 2013, quando então entraria em operação um novo emissário em Jaguaripe, veiculando 3,47 m3/s.

Cerca de 72 % da população da cidade são excluídos dos sistemas de esgotamento sanitário e dispõem seus esgotos de forma variada. Pode-se dizer que:

- o cerca de 17% da população lançam seus dejetos diretamente no solo ou em corpos d’água (FIBGE, 1991);

- o cerca de 26% usam: redes simplificadas de esgoto (4%), escadarias e rampas drenantes (15%) e galerias de águas pluviais (7%);

- o aproximadamente 35% da população contam com fossas, que proporcionam uma certa redução da carga orgânica a ser lançada no solo e em corpos d’água (FIBGE, 1991).

Assim, a maior parte dos esgotos produzidos na cidade está sendo lançada no solo e nos corpos d’água, podendo contribuir para a proliferação de doenças relacionadas com a falta de saneamento, notadamente na população infantil, assim como para a poluição dos rios que cortam a cidade e das praias.

Segundo MORAES (1993), 56 % da população de alta e média renda (> 5 SM) são atendidos pelo sistema da EMBASA, contra os 14% da população de baixa renda.

Prioridades de atendimento

A lógica da política de saneamento preconizada pelo PLANASA - Plano Nacional de Saneamento, concebido também nos anos 70, infelizmente ainda se mantém no estado da Bahia, apesar da sua falência e extinção na década de 80. A definição de prioridades de atendimento à população com serviços de água e esgoto ainda hoje se respalda nos pressupostos do retorno financeiro do capital investido através da cobrança de tarifas.

O Programa BAHIA AZUL não é diferente. O critério adotado para a prioridade de implantação das bacias coletoras de esgoto foi o retorno monetário do investimento, desconsiderando o quadro sanitário e de saúde das diversas áreas da cidade, principalmente da periferia, que foi excluída durante todos estes anos do acesso a esse serviço básico. Assim, até o momento foram privilegiados os bairros onde reside a população com maior capacidade de pagamento.

O argumento utilizado, que na realidade tem fortes vínculos com a concepção referida anteriormente, foi a necessidade de reduzir a capacidade ociosa do emissário submarino, conduzindo para ele os esgotos produzidos nas bacias mais próximas. É notório que esse argumento se traduz num sofisma e numa postura tecnoburocrata, não voltada, portanto, para a cidade real, mas para a cidade idealizada nas pranchetas e gabinetes dos funcionários e escalões do governo, em consonância com os interesses dos empresários e elites, à medida que a população que mais necessita do serviço não é ouvida nem atendida com prioridade.

Contraditoriamente, do ponto de vista ambiental, os subsistemas Comércio e Subúrbio, que são os únicos a contribuir com esgotos sanitários para a Baía de Todos os Santos, foram, inicialmente, previstos na RAPDES de 1993 para serem atendidos apenas em 1997 e 1998, respectivamente, com nível inicial de atendimento de 20% da população e previsão de alcançar o nível de atendimento de 80 % em 2002 e 2003. Ressalta-se que o mote da propaganda em torno do BAHIA AZUL está sendo realizado em torno da despoluição da Baía de Todos os Santos, e justamente a área que nela lança esgotos teve previsão inicial para ser atendida nos anos referidos. Certamente, o fato de o Governo do Estado receber reiteradas críticas das ONGs em torno dessa decisão contribuiu para sua revisão. Isso pode ser constatado nas recentes divulgações do Governo e no processo de licitação para as obras de esgotos nas bacias de Lobato, Cobre e Periperi, embora ainda deixando de fora a bacia de Paripe.

Não se pode, no entanto, ter uma postura ingênua e deixar de considerar que também existe uma série de interesses em torno da área do subúrbio, tanto do ponto de vista político-eleitoral como empresarial, o que certamente levou o Governo a adotar esta decisão. Toda atenção deve ser dada a essa área, pois os investimentos públicos a serem realizados poderão ser apropriados pelo capital imobiliário, em detrimento da população local. Esse risco aumentará na medida em que não se desenvolverem projetos capazes de gerar emprego e renda, proporcionando acesso dos cidadãos aos benefícios gerados pelos programas/projetos governamentais. Ao se melhorar a infra-estrutura do subúrbio (regularizando o abastecimento de água e implantando o esgotamento sanitário através do Programa BAHIA AZUL, além de drenagem pluvial, pavimentação e recuperação ambiental através de solicitação de financiamento da Prefeitura Municipal de Salvador em análise no BID), a área passará a ser procurada para investimentos do capital imobiliário (o que já vem ocorrendo) e se tornará atraente para a classe média, que demanda habitação com serviços urbanos de qualidade, além da vista exuberante da BTS proporcionada pelo local. E, assim, a população local poderá ser levada a mudar-se para áreas mais distantes, não dotadas de infra-estrutura e de condições satisfatórias para uma vida saudável e produtiva. Processo semelhante é relatado por OLIVEIRA et al. (1995) ao avaliar o programa Reconstrução-Rio na Baixada Fluminense.

A questão da tarifa

Todo serviço de abastecimento de água e esgotamento sanitário prestado diretamente ou através de concessão é remunerado através de tarifas cobradas aos consumidores. Essas tarifas são estabelecidas visando cobrir os custos de implantação e operação dos sistemas implantados.

Assim, na cidade do Salvador, 90% da população ligada à rede de abastecimento de água operada pela EMBASA paga por esse serviço em função da classe social e dos níveis de consumo. A população que está ligada à rede pública de esgoto da EMBASA ou que é servida por sistema de coleta e tratamento independente, além de pagar a água consumida, paga também pelo serviço de esgoto. Os que estão ligados à rede da EMBASA pagam de conta de esgoto 80 % do valor da conta de água, enquanto que os ligados à rede dos sistemas independentes pagam 45%, - isto porque esta não foi implantada pela EMBASA, que cobra apenas a operação do sistema.

Dito isto, fica claro que os futuros usuários do serviço de esgotamento sanitário implantado pelo BAHIA AZUL passarão a pagar por ele a partir do momento em que sua residência for ligada à nova rede coletora. No BAHIA AZUL, o valor da tarifa de esgoto é calculado segundo os critérios descritos anteriormente, sendo que a tarifa será de 45% do valor da conta de água nos locais onde forem implantadas redes condominiais e a população assumir sua manutenção.

Assim sendo, embora a cobrança do serviço para o novo usuário não represente um aumento da tarifa cobrada pela EMBASA, ele representará efetivamente um aumento na conta mensal a ser paga pelo consumidor à EMBASA, e consequentemente, isso significará um aumento nas despesas mensais do usuário.

Além disso, a EMBASA será obrigada a realizar aumentos tarifários, atualmente chamados de "recuperações tarifárias" , para garantir aos órgãos financiadores do Programa o retorno do capital emprestado para as obras. Foi inclusive com o intuito de cumprir com acertos mantidos com a missão do BIRD que o Governo do Estado autorizou a EMBASA a realizar a primeira "recuperação tarifária" em junho e julho de 1995, quando então a tarifa aumentou em 32%.

O Fórum não discorda da cobrança do serviço. No entanto, discorda dos valores estabelecidos e da não divulgação dessa informação para a população através dos instrumentos que vêm sendo utilizados na mídia para divulgar o Programa. Uma outra questão diz respeito aos critérios técnicos utilizados para a definição das tarifas. Existe a necessidade de elaboração de estudos contendo as planilhas de custos que justifiquem os 80% e 45% utilizados para a definição da tarifa de esgoto, na medida em que estes valores não podem sair da "manga" da tecnoburocracia do governo, pois sabe-se que uma boa parcela da população hoje excluída de condições mínimas de sobrevivência vai ter dificuldade para pagar por esse serviço.

É necessário, portanto, que a população conheça e discuta amplamente a política tarifária a ser adotada pelo Governo com o BAHIA AZUL, exercendo dessa forma o seu direito de cidadã e consumidora, apesar da resistência do Governo em estender esse debate à sociedade baiana, que hoje pode falar da despoluição das praias mas não está informada sobre quanto vai pagar por isso. Deve-se buscar avaliar as possibilidades que tem o povo de pagar esta conta, e como deve ser paga, segundo as condições sócio-econômicas de cada grupo social.

Fonte: Fórum Controle Social do Bahia Azul

4 comentários:

  1. Gostei muito!
    Ajudou bastante em meu trabalho!
    Valew!

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  2. Procuro um fucionaro com o nome osmar reis xavier.

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  3. Preciso saber onde passa a rede bahia azul na rua planalto ao lado da caixa economica no cabula

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